15 maio 2011

Cinzas de um pesadelo real

    Era madrugada. Você achava que seria uma noite qualquer, talvez fosse se não tivesse acordado dos seus sonhos. Você ouviu o barulho estridente do telefone, levantou da cama, lágrimas, "O que houve?". Você só queria ajudar, eu podia escutar seu coração batendo acelerado dentro do seu peito, eu podia ouvir sua respiração enquanto segurava o choro. Eu estava lá quando o portão foi arrombado e pude ver também aqueles olhos vermelhos e rosto inchado entrando dentro no pátio da sua casa. Você queria ajudar, queria impedir, mas só conseguia ver por entre as frestas o que acontecia naquela noite sem luar. Seu irmão pensou que fosse brincadeira, você desejou achar isso também, mas há muito você tinha crescido e sabia que não havia mais brincadeiras naquele relacionamento.
    Eu estava lá quando seus ouvidos escutaram os gritos que rompiam o silêncio do dia que amanhecia, e quando você tentou abrir a janela pra ver quem era que tentava invadir sua casa, ninguém deixou. Eu senti o mesmo medo que você quando as batidas na porta se tornaram freqüentes e os insultos ameaçadores. Você queria sua mãe, mas ela não estava ali. Tinha fugido. Você não.
   Foi nesse momento que você sentiu aquela tristeza, e aquele sentimento de querer ajudar e não saber como. O homem estava rondando a casa e você queria que ele fosse embora, para sempre. Você era tão frágil mas vestia uma máscara de forte, e eu sabia que ela logo ia rachar. 
   Era manhã. O pesadelo continuava. Com a luz você pensou que ele tinha ido embora não é? Chegou a abrir a porta e ir até a calçada, bem a tempo de ver aquele homem voltando, com as pernas bambas e bêbado. Não olhou o rosto dele né? Mas eu olhei.
  As portas foram trancadas novamente e você feita de prisioneira. Queria chamar a policia, mas não podia. Queria fugir mas tinha medo das agressões que pudessem ocorrer. Queria dormir mas o barulho dos gritos que ele berrava não deixavam você sequer fechar os olhos. Foi quando você viu quem ele realmente era não é? Pela primeira vez odiou aquele homem que insultava sua mãe e tentava invadir sua casa. Pela primeira vez desejou nunca mais vê-lo. Sua confiança foi abalada para sempre. Depois de uma madrugada inteira de insultos, um portão quebrado, e duas crianças assustadas, conseguiram levá-lo embora, precisaram arrastá-lo. A cena nunca mais saiu da sua cabeça. Aqueles olhos vermelhos a fitavam quando fechava os olhos. Eu vi quando você prometeu proteger sua mãe e jurou não abraçá-lo mais, mas eles te obrigaram não é? Fedia a álcool. Se pudesse fugiria para sempre.
    Eu vi você chorando, com medo, com raiva. Aquele homem era seu pai. O seu herói que virou bandido e depois simplesmente nada. Por mais que doesse você continuou amando-o mas nunca mais confiou e o olhou da mesma maneira.
  Ele não se lembrou do que houve, mas você nunca esqueceu. Eu vi quando você finalmente pode abraçar sua mãe e quando você se permitiu chorar. Eu estava lá, sabe quem sou? Sou a menina feliz e confiante que foi embora naquela madrugada quente e deixou apenas um projeto de adulto jamais finalizado. Eu era o que você foi um dia.

3 comentários:

  1. E quantos projetos de adulto jamais finalizados ficam perdidos por aí.
    Belo texto Yasmin!

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  2. Não acredito que já tinha visitado teu blog, e não te seguia =x
    Gostei daqui, gostei mesmo.
    Gostei do teu cantinho rs (:
    Estou seguindo ;*
    Se der, dá uma passadinha no meu, pode ser?
    E se gostar...
    rs

    http://umamor-demenina.blogspot.com/

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