06 junho 2013

Pequena Sofia

Sofia tinha 10 anos. Enquanto todos brincavam com bonecas e seus filhos e planejavam a chegada de um pseudo príncipe, ela nem tocava em suas bonecas, nunca lhe ocorrera que elas deveriam ser tocadas. Fazia bonecas de pano, como as outras, a diferença é que as dela não mantinham a cabeça por muito tempo. Gostava de fazê-las sem braços, ou sem mãos, ou sem nada por dentro, essa ela chamava de Sofia. Era sempre a primeira a morrer.

Enquanto todas brincavam de casinha, ela se torturava com elas. Deixe-me explicar melhor, cadeirinhas rosas e pequenas possuem pontas boas para tortura, uma de suas brincadeiras prediletas era espalhar os brinquedos no chão ou na cama, principalmente as cadeirinhas, e deitar com a barriga em cima delas. Ia soltando o peso aos poucos até estar completamente imersa na dor. Era então que inventava historias, em todas elas era ela a  que merecia a tortura. 

Ninguém nunca soube de sua brincadeira favorita que iniciara por volta dos 8 anos, se notavam o vermelhidão pensavam ser apenas alguma alergia qualquer. Imaginar uma outra família, como meninas da sua idade, nunca chegou em seus pensamentos.

Crianças podem ver o nosso interior, e esse era o principal medo de Sofia, quando olhava os olhos de alguma criança só enxergava o vazio, o seu vazio refletido em uma pequena forma de vida. Calava-se, fingia que aquele ser que quase tinha a sua idade não existia. Nunca funcionou por muito tempo. Aos 11 decidiu usar a fantasia que todos usam, aquela amorosa com fala fina e idiota quando se fala com um bebe. Só conseguiu ser um pouco mais querida, mas ignorar ainda era o seu lema.

Hoje Sofia já passou dos 20 anos mas continua com a mesma ideia que prometera a si mesma aos 10 anos. Seria muito bom se pudesse retirar seus órgãos reprodutores só pra garantir não correr riscos. Não queria ter a chance de cometer tal crime, não seria humana como a humanidade de usar uma criança para concertar vícios insanáveis. Somos todos frutos dos mesmos erros e das tentativas inúteis de concertá-los. Não passaria seu problema adiante, quebraria aquela corrente.

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